É verdade que muitos procuram por tesouros em Ouro Preto fascinados pelas histórias de achados. Na verdade, a maioria nada encontra já que poucos são os escolhidos. Esta busca, no entanto, tem sua explicação.
Toda a Serra do Ouro Preto é furada por minas como um queijo suíço. Esta serra se estende do Bairro São Cristóvão (Velloso) até Passagem de Mariana, passando pelo bairro de Antônio Dias, Lages, Alto da Cruz, Padre Faria e Santa Efigênia. Muitas casas situadas nesses bairros têm bocas de minas em seus quintais. Isso atiça a imaginação e curiosidade de seus moradores. Alguns, por medo, mandaram tampar aquelas aberturas com pedras, ou tijolos e cimento. O desconhecido é temido. Não se deve revirar o passado, é crença geral. Em alguns casos o desconhecimento fez dessas minas depósitos de lixo ou guarda entulhos. Outros cidadãos, no entanto, mais audaciosos e com mais visão, perceberam a importância da mina em sua propriedade como atração turística. Então, decidiram investir em pesquisas, iluminação e transformaram o que poderia ser uma ameaça, em fonte de renda. Assim, moradores e turistas puderam conhecer as minas do século XVIII, o trabalho de extração do ouro e como ele aparecia em veios no meio das rochas.
Existe a crença de que ainda há muitos tesouros escondidos dentro dessas minas. Devido à cobrança do quinto do ouro por parte de Portugal no século XVIII, muita gente escondia ouro, uma espécie de poupança. O ouro era guardado em botijas, bolsas de couro ou baús e enterrado em locais secretos que podiam ser debaixo do assoalho da casa, no meio das paredes de pau-a-pique ou da mina.
Até os escravos escondiam ouro, juntavam pouco a pouco para comprar sua liberdade ou para fugir para bem longe. Dizem que, quem encontrar ouro de escravo tem que dar uma parte para a irmandade dos pretos sob pena de acontecer desgraça na família. Praga é coisa que todos temem.
Muitos mapas de tesouro já foram encontrados. Conheci muitas pessoas que procuravam tesouros nas horas vagas. Alguns se tornaram tão obcecados que largaram seu trabalho para se dedicarem inteiramente a esta busca. Não sei de um desses que tenha encontrado ouro. Falam pela cidade que fulano ou beltrano encontrou ouro porque enriqueceu de repente.
O TESOURO DE CLAUDIO MANUEL[1]
Existe um tesouro que nunca foi encontrado: o tesouro de Cláudio Manuel. Talvez um tesouro patriota, guardado para a construção do país, para quando o Brasil se separasse de Portugal.
Muitos foram aqueles que buscaram por ele: o famoso tesouro dos Inconfidentes! Seriam muitas arrobas de ouro escondidas num local de difícil acesso, próximo ao Pico do Itacolomi. No documento havia a descrição do local, acompanhado de um mapa. Pelas indicações dadas seria perto de uma cachoeira, na junção do córrego do Baú com o córrego do Itacolomi.
Foram os cidadãos ouro-pretanos, Gilberto de Carvalho e Inácio Pinheiro, no ano de 1939, que se jogaram nesta empreitada. Vou contar como foi desde o começo.
O Instituto Butantã comprava aranhas, escorpiões e outros bichos peçonhentos, para fazer vacinas. O então jovem Gilberto de Carvalho saiu a procurar os tais bichos, nas horas de folga. Revirando o porão da casa de sua família situada na rua são José, ele encontrou uma caixa de madeira e dentro dela alguns documentos muito antigos, preservados em carvão. O documento era de 1788 e explicava detalhadamente onde havia sido enterrado um tesouro e também que haviam sido mortas as nove pessoas envolvidas neste trabalho “não deixei testemunha a não ser a terra porque esta não tem boca para falar.” Dizia o texto assinado por Domingos Affonso Bastos e dirigida a Cláudio Manoel da Costa.
Imediatamente Gilberto entrou em contato com Inácio Pinheiro e os dois saíram atrás das indicações, bem claras, daquele tesouro.
Seguiram a risca o roteiro indicado no documento e chegaram à pedra lavrada no arco da ponte de Bocaina do Tripuí. Emocionados, tiraram a pedra e, dentro do local, encontraram a chave, que era de ouro maciço. Prosseguindo na busca, encontraram os nove esqueletos dos sete escravos, o capataz e sua mulher, mortos na ocasião do ocultamento do tesouro. Tudo ocorria de acordo com as indicações. Eles estavam muito animados e contrataram homens para trabalhar.
A chave deu sessenta e quatro gramas de ouro que eles venderam por um conto e quinhentos. Precisavam de dinheiro para prosseguir com as buscas. Gilberto Carvalho chegou a comprar o terreno onde estaria a mina e passou a buscá-la incessantemente. Apostou tudo que tinha nesse sonho. Mas não havia jeito de encontrar o tesouro.
Aos dois pesquisadores, juntou-se José da Costa Carvalho Filho e, os três, foram ao Rio de Janeiro pedir financiamento. Precisavam de capital para continuar as buscas do grande tesouro que seria dividido entre eles e o governo federal.
Getúlio Vargas era muito sentimental em relação a Ouro Preto por haver estudado ai na juventude. Sendo assim, ordenou o empréstimo de trezentos contos de réis para a empreitada. Os pesquisadores do tesouro passaram muitos meses no Rio de Janeiro às voltas com o Ministério da Fazenda, o Banco do Brasil e o Código Civil.
Tamanha burocracia acabou jogando por terra as pretensões dos três sonhadores, que queriam desenterrar a imensa fortuna e a biblioteca do poeta inconfidente, Cláudio Manuel da Costa. Dinheiro mesmo não saiu nada e os três voltaram decepcionados para Ouro Preto.
Esses homens passaram o resto de suas vidas atrás do sonho de encontrar esse tesouro. Gastaram muito dinheiro na empreitada, ocuparam todo o seu tempo nisso, viveram uma grande aventura.
Nas palavras do próprio Gilberto:
- De minha parte gastei quarenta contos nas pesquisas. A mina devia estar ali por perto. Mas esta é uma região em que os efeitos da erosão são quase inacreditáveis. É muito comum uma bananeira “viajar” muitos metros em poucos meses dentro desses quintais de Ouro Preto.
Esse foi o motivo alegado para o fato da mina não ter sido encontrada depois de anos de buscas.
[1] Documento e reportagem da revista O Cruzeiro de 10 de janeiro de 1953, fornecidos pela família de Gilberto Carvalho.
Artigo de Angela Xavier - Contadora de Histórias - 5/09/2014