O retorno do Rio é sempre algo pesaroso , afinal, deixar o paraíso é, há cada quilômetro, algo doído pra mim.
Pulei pro banco de trás pra dormir. Ricardo resmungou. Descemos a serra e cochilei. Quando dei por mim estávamos numa parada, entre Juiz de Fora e Barbacena. Abri os olhos e dei de cara com uma placa: "Vende-se carne de jacaré". Por alguns instantes senti medo: será que Ricardo havia parado para comprar esta iguaria exótica? E o pior: eu teria que botar a mão na massa? Ou na carne? Gelei.
Pra minha surpresa Ricardo retornou com um presente ainda pior: um coraçãozinho de pelúcia, com dois bracinhos: I love you.
Sorry, baby, mas isso não entra em casa (o bom de estar casado é que dá pra recusar presentes...kkk)
Propus a troca.
Ele voltou com dois CDs: um Love Hits, daqueles rocks mela cueca de propaganda de Hollywood. E um Roberto Carlos em Jerusalém.
Optei pelo Rei, claro. Apesar de estar um pouso de mal depois do filme do Tim, que o colocou como uma caricatura ridícula e egocêntrica... Mas como quem é Rei nunca perde a majestade, minha porção de súdita falou mais alto.
À medida em que as músicas iam tocando era como se passasse um filme da minha vida. Ouvir Roberto Carlos é como abrir um diário. Goste você ou não dele, não há como não acessar nosso HD emocional.
Ouvindo "Eu quero ter um milhão de amigos e bem mais forte poder cantar", estava eu criança correndo pelo Morro da Forca nos concursos de papagaio. Papai sempre me aplicou em programas de meninos. De modo que sempre adorei papagaios, peladas, enduros e corridas.
Depois escutamos "Olha", "Proposta" e "Falando Sério". Mas foi ouvindo "Eu cheguei em frente ao portão, meu cachorro me sorriu latindo", que vi uma lágrima nos olhos do Ric. Ele se lembrando de Vargem Grande, de quando sua mãe o esperava cheia de carinho e estrogonofe com arroz soltinho.
Uma das músicas falava dos sonhos que deixamos pelo caminho. E, emotiva como estou me lembrei de todas as Blimas que já fui: repórter de TV (a melhor fase de todas, grandes amigos cinegrafistas, altas risadas no carro em busca das notícias), apresentadora, atriz de teatro, colunista, editora. Como a vida me afastou de tudo, tão precocemente... Como todos os anos de faculdade e dificuldades se perderam neste funil que é viver.
Foi então que me veio a vontade de escrever um livro. Mas será que este sonho eu também terei que deixar perdido nas "Curvas da Estrada de Santos"?
Blima Bracher
Jornalista/ Documentarista
(31) 8431-3737