As vezes a solidão me sufoca neste apartamento e meus olhos me esmagam
no espelho: lindos, mas tristes. Sem resposta. Estou caindo no abismo
do pânico. Vem o grito que não quer calar: pra que tudo isso? Nestas
horas nem Buda, nem Maomé dão jeito. Jesus é um sopro de carinho no
coração. Mas o que justifica este peso? Um filho? Uma viagem? Um fim
de semana em Salvador?
Os dias cada vez mais longos. Leio escrevo, saio procurando salas
escuras de cinema e observo a vida passar. Devorei um saco de pipocas
em frente ao Belas Artes. Comprei ingresso, mas devolvi. Nem meus filminhos mofentos
me inspiram hoje.
Na Praça da Liberdade todos correm e suam: correm atrás da boa forma.
Eu queria ter um objetivo simples assim. Ou quem sabe me preocupar com
os buracos da rua ou com o vestido que vou usar na boate no fim
de semana.
Mas tudo é vão. Meu peso é maior. Podia fazer caridade. Visitar um
centro espírita. Mas não tenho o menor saco. "Aí eu me afogo num copo
de cerveja, nela esteja a minha solução". Mas nem a cerveja desce.
Beber sozinha não tem graça. E nem acompanhada, ultimamente.
Penso no meu pai, nas salas de exposição. O dobro da minha idade
e mil vezes mais entusiasmo. Eu vim com dose a menos de serotonina.
Tomo minha fluoxetina de manhã, mas a esta hora o efeito passou.
Tem dias em que me sinto o pilar do mundo. E outros em que sou o
calcanhar de Aquiles. Estou nos dias de calcanhar.
Escrevo pra você, porque sei que me acessa. Minha cabeça gira a mil, e a
sua acompanha. É bom saber que há vida inteligente na madrugada.
Paula me deu livros de espiritismo. Estão aqui me olhando. Auto-ajuda
a esta hora? Prefiro uma coca light.
Refaço o projeto da reforma do apartamento e me distraio um pouco. Aí penso na conta.
Sai dessa jacaré. Respira. Se olha, de novo no espelho. Mas os
olhos são sempre os mesmos: tristes.
Ver vídeos engraçados de madrugada? Nem Reginaldo Rossi nem Gretchen me salvam
hoje. Tentei até clipes do Velhas Virgens. Nada adianta.
Pego meus pesinhos e vou ver BBB. Na Globo News tem três prédios desabados.
Meus olhos se entortam a cada dia. O estrabismo está voltando. Será
que vou ter que usar mais tampão? Quando era pequena mamãe tampava uma
das vistas. Era legal: tinha papel Contact de bichinhos. Adorava um de
sapinho.
Imagina eu ceguinha com um sapinho no olho... Pois é, de tanto que
gostava do sapo ainda não achei meu príncipe ( gente, esta crônica foi escrita em 2011, antes da dinastia Ricardiana)
Só queria uma cabeça pra me escutar de madrugada. Você amanhã toma uns on the rocks, senta com sua turma e se sente
mais leve.
Eu não tenho ânimo pra nada. Nem fui trabalhar hoje. Fiz as
entrevistas complementares por aqui mesmo.
As editoras aprovaram. Lá fora a vida segue normal. Nestas horas tenho
saudades da redação. Mas não tenho vontade de pegar um taxi e subir.
Tá na hora de apagar. Amanhã , se Deus quiser será um dia de pilar.
Glória a Deus aleluia irmão. Chocolate na veia. Acho que ainda sobrou
uma barrinha na dispensa. Senão ataco o miojo da Cida.
Blima Bracher
Jornalista/ Documentarista
(31) 8431-3737