CINEOP - MOSTRA DE CINEMA DE OURO PRETO - Foto Jackson Romanellli-Universo Produção
Com 103 filmes e diversos shows, bate-papos, seminários e lançamentos de livros, evento dedicado ao patrimônio, à história e à preservação do audiovisual brasileiro segue até o próximo dia 10, discutindo a descentralização dos acervos, a singularidade das experiências femininas para o aprendizado escolar e os núcleos e cineclubes fora do eixo Rio-SP; Apresentações artísticas têm bandas locais, blocos carnavalescos e roda de conversa, tudo gratuito
Na quinta-feira, dia 6, começa a 14a edição da CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto, o principal evento audiovisual brasileiro dedicado à preservação que conjuga Patrimônio, Educação e História. Como em todos os anos, a cidade mineira Patrimônio da Humanidade recebe dezenas de preservacionistas, pesquisadores, jornalistas, professores, críticos, estudantes e espectadores para acompanhar uma vasta e intensa programação, totalmente gratuita e que se estende até o dia 10 de junho. Entre filmes, seminários, encontros, workshop, roda de conversa, apresentações musicais e sessões de cinema ao ar livre - na Praça Tiradentes, ou no imponente Cine Vila Rica, a CineOP segue firme no propósito de valorizar a produção audiovisual em várias possibilidades de apreensão.
A cerimônia de abertura, às 20h30 no Cine Vila Rica, vai apresentar o tema geral da mostra deste ano: “Territórios regionais, inquietações históricas”. Dirigida por Chico de Paula e Grazi Medrado, com trilha sonora ao vivo do Barulhista, a performance audiovisual vai destacar as relações entre os três eixos da CineOP (as Temáticas Histórica, Educação e Preservação) e prestar tributo ao cineasta baiano Edgard Navarro. Homenageado desta edição, o diretor receberá o Troféu Vila Rica. Ainda participam da abertura a cantora Adrianna, o ator e contador de histórias Marcelino Xibil Ramos, o multi-instrumentista Marcelo Ricardo e a atriz Rejane Faria.
Em seguida à performance, serão exibidos dois trabalhos emblemáticos da trajetória de Edgard Navarro: o curta “Exposed” (1978), que relaciona as vertentes do poder (econômico, bélico, político) à busca dos líderes políticos em expor uma suposta potência sexual; e o média-metragem “Superoutro”(1989), que completa 30 anos desde sua primeira exibição e mostra a figura tragicômica de um louco de rua (Bertrand Duarte), anti-herói contemporâneo que, através da imaginação caótica e alucinada, tenta se libertar da miséria que o assedia. Navarro vai papear com o público da CineOP na sexta-feira, às 12h, numa roda de conversa no Centro de Convenções.
A programação de abertura chega à sua conclusão com a Noite Tambores e Sons Ouro-pretanos no Sesc Cine Lounge Show, também no Centro de Convenções. Os grupos Vilodum e Candonguêro sobem ao palco com o melhor do Axé Baiano e da música brasileira.
[MOSTRA DE CINEMA DE OURO PRETO - Foto Leo Lara-Universo Produção]
PROGRAMAÇÃO
Até o dia 10 de junho, serão 103 títulos (12 longas, 4 médias e 87 curtas), distribuídos nas mostras Contemporânea, Preservação, Histórica, Educação, Mostrinha e Cine-Escola. As atividades da CineOP, sempre gratuitas, ocupam três espaços na cidade: o Cine Vila Rica, aberto especialmente para o evento; a Praça Tiradentes, onde é montada uma tela ao ar livre para as sessões do Cine Cemig na Praça; e o Centro de Artes e Convenções, onde fica a sede da produção e acontecem os encontros e debates temáticos do Encontro Nacional de Arquivos e Acervos Audiovisuais Brasileiros e do Encontro da Educação: XI Fórum da Rede Kino.
A ideia para a temática central, “Territórios regionais, inquietações históricas”, surgiu a partir do estímulo de se pensar, num país de dimensões continentais, as particularidades das regiões e dos territórios que compõem o Brasil. As três equipes de curadoria da CineOP se guiaram pela noção de território e de suas especificidades e forças propositivas, interligando as conversas sobre história do cinema, patrimônio audiovisual e educação. O cinema é espaço de formação para uma comunidade e um território que ajuda a dar identidade ao país, ao mesmo tempo em que pensa suas principais questões e contradições.
Com curadoria de Lila Foster e Francis Vogner dos Reis, a Temática Histórica buscou trabalhar o conceito de territórios através de um cinema do passado que desse conta das infinitas possibilidades de sentido da palavra. A escolha foi por destacar núcleos de produção regionais que, na força de suas geografias, romperam barreiras e fronteiras do eixo Rio-SP. Algumas das experiências a serem apresentadas com filmes e mesas de debate vêm da Porto Alegre dos anos 1980, com a Casa de Cinema; de trabalhos coletivos, como o Grupo Mel de Abelha, do Piauí, e a Corcina (Cooperativa dos Realizadores Cinematográficos Autônomos), do Rio de Janeiro; e de eventos de formação e compartilhamento, como a Jornada de Cinema da Bahia, os festivais de Super-8 nos anos 1970 e o Cineclube Antônio das Mortes, de Goiás. Uma série de exibições de filmes relacionados a estes grupos consta na programação, como o longa “Inverno” (1983), de Carlos Gerbase; e os curtas “Milagre de Lourdes” (1965), de Carlos Alberto Prates Correia; “Vestibular 70” (1970), de Vladimir Carvalho e Fernando Duarte; e “Aluminosa Espera do Apocalipse” (1980), de Rui Vezzaro, Fernando Severo e Peter Lorenzo.
Na Mostra Contemporânea, a dupla definiu trabalhos que, de alguma forma, dialogam com a memória, o arquivo e as noções de território e espaço que permeiam a mostra em 2019. Chegaram a um conjunto de sete títulos em pré-estreia que vão de perfis de personalidades do audiovisual à abordagem etnográfica de comunidades e culturas específicas. Entre os títulos, estão “A Mulher da Luz Própria”, de Sinai Sganzerla, que documenta sua mãe, a atriz e diretora Helena Ignez; “Carvana”, de Lulu Corrêa, sobre a trajetória do ator Hugo Carnava; “Gilda Brasileiro, Contra o Esquecimento”, de Roberto Manhães Reis e Viola Scheuerer, que investiga uma estrada clandestina usada por traficantes de escravos no século XIX e da qual ninguém parece querer falar a respeito; e “Até Onde Pode Chegar um Filme de Família”, de Rodolfo Nazareth Junqueira Fonseca, em que imagens de arquivo de Aristides Junqueira, pioneiro do cinema em Minas Gerais e natural de Ouro Preto, servem de reflexão sobre o começo da produção de filmes no país.
Nos curtas-metragens, a curadora Camila Vieira escolheu 15 títulos contemporâneos marcados especialmente pela apropriação das imagens de arquivo como orientação para compreender os ecos do passado no presente e a experimentação da forma cinematográfica na exploração ou mesmo textura da película como marca estética para criar narrativas. Em usos variados dos registros, alguns dos filmes são “Arara - Um filme sobre um filme sobrevivente”, de Lipe Canêdo e “Sem título #5: A Rotina terá seu Enquanto”, de Carlos Adriano.
Na Temática Educação, as curadoras Adriana Fresquet e Clarisse Alvarenga definiram para o enfoque “Mulheres: terras e movimentos”, com a presença de projetos audiovisuais educativos que abordam os movimentos femininos em ambiente privado (doméstico ou familiar) e nas intervenções em espaços públicos (escolas, cidades, aldeias indígenas, quilombos, organizações da sociedade civil ou instituições públicas, urbanas e do campo). O Fórum da Rede KINO (Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual) chega à 11a edição e acontece dentro da programação da CineOP, com apresentação de projetos, mesas de debate, estudos de caso e de experiências e exibição de filmes. O Encontro da Educação pretende valorizar o cotidiano escolar, dedicando atenção para refletir sobre a inserção feminina da mulher dentro do cotidiano escolar, utilizando o cinema para discutir e alterar o contexto de violência, exclusão e invisibilidade que historicamente acompanha a mulher brasileira – tendo por consequência altos índices negativos, com grande número de subempregos, exploração e assassinatos.
Haverá apresentação de 13 projetos latino-americanos envolvendo mulheres no audiovisual e uma mesa que trata, de uma perspectiva decolonial, a educação com o cinema no contexto escolar. Dentro da Mostra Educação, serão exibidos 34 filmes, entre curtas e longas-metragens produzidos também em sala de aula. As mesas do Fórum vão trafegar por diversas formas de representatividade e vozes de experiências singulares e distintas. Alguns dos debates são “Mulheres, terras e territórios”, com as presenças de Mãe Efigênia (Quilombo Manzo Ngunzo Kaiango) e as militantes indígenas Sandra Benites e Célia Xakriabá; “As mulheres negras e o cinema”, com Alexia Melo (arte-educadora e realizadora audiovisual), Janaína Oliveira (pesquisadora e curadora) e Makota Kidoiale (coordenadora do projeto Kizomba); “Cinema e educação: cooperação na América Latina”, com Clara Inés Suárez (Festival Cine a La Vista, Argentina), Graciela Acerbi (Cineduca, Uruguai), Regina de Assis (TV Escola, RJ) e Solange Stecz (educação audiovisual na formação de docentes, PR); e “As mulheres indígenas no cinema”, com Luisa Elvira Belaunde (Museu Nacional/UFRJ), Mari Corrêa (cineasta e diretora do Instituto Catitu, SP) e Patrícia Ferreira Pará Yxapy (realizadora audiovisual indígena e professora na Aldeia Ko’enju, RS).
A Temática Preservação, com curadoria de Ines Aisengart Menezes e José Quental, definiu o recorte “A regionalização e a formação do patrimônio audiovisual brasileiro”. A ideia é discutir a centralização e descentralização dos arquivos em território nacional. Num país de proporções continentais como o Brasil, e numa época caracterizada por uma produção exacerbada de imagens digitais, onde estão ou serão guardados tantos materiais? Diante de um governo federal ainda nebuloso em relação a políticas de preservação, o que esperar do poder público? Quais os desafios enfrentados por instituições de salvaguarda que não estão no centro das ações do Estado? Em paralelo, os debates na CineOP pretendem investigar a construção do território e da noção de “regional” numa perspectiva histórica.
Assim como em 2018, o Encontro de Arquivos vai se expandir em pontos de discussão com mesas e convidados se intercalando, com temas como: “Ações e políticas regionais para a preservação audiovisual”; “Difusão e a formação de plateias”; e “Regionalização na esfera internacional”, com a presença internacional de Cécile Petit-Vallaud, diretora da Cinemateca de Bretanha.
A Mostra Preservação deste ano permitirá a três importantes projetos entorno do patrimônio audiovisual serem mostrados no Cine Vila Rica e discutidos no Centro de Convenções: “Rio da Dúvida”, de Joel Pizzini, sobre a Comissão Rondon; “Canal Thomaz Farkas”, criado com o objetivo de difundir a produção cinematográfica do documentarista húngaro radicado no Brasil; e uma série de curtas-metragens vindos da Cinemateca de Bolonha.
Além da ampla grade de filmes e de encontros, a CineOP promove uma programação artística com shows, performances, lançamentos de livros, exposição e Cortejo das Artes, com grupos e bandas locais. A curadoria artística é do Sesc em Minas, parceiro cultural do evento, e incorporou a temática deste ano na seleção das atrações. Tudo isso estará no Sesc Cine Lounge Show, no Centro de Artes e Convenções, sempre a partir das 22h, entre os dias 6 e 10 de junho.
Entre as atrações, a banda Forró de Bolso, a cantora Dona Jandira, o MC Roger Deff, o bloco Chama o Síndico e a cantora Julia Ribas são alguns dos destaques. A entrada é sempre gratuita, com retirada de senhas no dia de cada atração, a partir das 22h, na bilheteria do espaço.
SOBRE A 14ª CINEOP
Realizada na cidade patrimônio mundial da humanidade, a CineOP estrutura sua programação em três temáticas de atuação: Preservação, História e Educação, que convergem a cada edição em suas preocupações conjuntas para o aprofundamento de fatos históricos, do saber audiovisual e da preservação junto à sociedade brasileira. Preocupam-se com estratégias, instrumentos, agentes e políticas que viabilizem transformações necessárias a uma sociedade mais justa, ativa e preocupada com seu patrimônio humano, histórico, cultural e artístico.
A temática central desta edição é “Territórios regionais, inquietações históricas”. O homenageado é o cineasta baiano Edgard Navarro. No ano em que o diretor completa 70 anos, seu filme mais paradigmático, Superoutro, atinge a marca de três décadas desde o lançamento e seu mais recente trabalho, Abaixo a Gravidade, ganha o circuito comercial. O momento é ideal para celebrar a liberdade e a iconoclastia de um artista como Navarro.