Foto: Lucas de Godoy
São 65 anos dedicados à fotografia, transitando entre Mariana e Ouro Preto, e muita história para contar. Marcio Eustáquio de Souza é o homenageado do Fotógrafos em Ouro Preto e Mariana – Edição 2016.
:: História de família ::
A fotografia surgiu na vida da minha família por volta de 1920, em Juiz de Fora. Meu pai, natural de Monsenhor Horta [distrito de Mariana], morava lá e era barbeiro. Ensinou esse ofício para o filho de um fotógrafo e, com ele aprendeu a arte da fotografia. Meu pai vendeu a barbearia e voltou para os lados de cá, para trabalhar com fotografia.
Naquele tempo, a fotografia era um verdadeiro segredo, ninguém passava nada para ninguém. Mas depois que eu aprendi, comecei a passar meus conhecimentos pra frente.
:: A descoberta da fotografia ::
Comecei com cinco anos de idade. Hoje, tenho 70. Naquela época, via meu pai e meu irmão entrando para o quarto escuro e ficava curioso “pra” saber o que tinha lá. Então, entrava quando eles não estavam, mas via tudo escuro e não entendia nada. Mas um dia, esqueceram a luz vermelha acesa, e foi aí que eu entrei na fotografia.
Comecei a fazer tudo sozinho, porque eu tinha medo de repreensão. Meu pai e meu irmão não descobriram nunca. Mas um dia contei pro meu irmão e ele começou a me ensinar. Alguns anos depois, me ensinou como ajustar a câmera para fazer retratos. Foi assim: ele trabalhava na prefeitura de Mariana e, quando aparecia algum retrato “pra” tirar, a gente corria lá na prefeitura pra chamá-lo. Eram 300 metros de distância. Um dia, fiquei com preguiça de ir e disse que eu mesmo ia fotografar. Quando ele chegou e revelou, tinha dado errado. Tudo tem que dar errado no princípio “pra” depois dar certo. Então ele me mostrou como fazer o certo. Dali pra frente, eu fazia e ele, quando chegava em casa, revelava. A preguiça me iniciou na fotografia. De lá pra cá, venho treinando muito, fazendo experiências.
:: As fases na fotografia ::
Passei por seis fases na fotografia. A primeira, com a câmera de fole, que o foco vai do zero ao infinito. Depois, com a fotografia manual, em que a gente fazia tudo sozinho, aprendi a trabalhar no quarto escuro. Em seguida, a fotografia semiautomática. Depois, na automática, seguida pela digital. Finalmente, no que chamo de digital moderno, em que as câmeras estão preparadas para ninguém errar. Hoje, todo mundo é fotógrafo. Se a pessoa não sabe fotografar, a fotografia sai mesmo assim, a máquina vai trabalhar sozinha, se ficar no automático.
A primeira foto que tiro, a primeira é sempre no automático. Vou obter 60% de qualidade nela. A partir da segunda, já mudo pro manual e vou fazer as minhas transformações, com valor de tempo e valor de abertura. E faço o necessário para fazer uma fotografia mais bonita.
:: Acervo e estudo ::
Tenho 400 câmeras, entre foles, digitais e convencionais, essas popularizadas por George Eastman, criador da Kodak. Foi ele quem começou a vender em massa, criou o filme rolo também. Nunca expus esse acervo. Penso em colocar algumas na loja [a Marezza Fotos, em Mariana]. Minha primeira câmera digital foi uma Canon D-60, que custou o preço de um automóvel zero km. Comecei a aprender com ela à noite, no banheiro, escondido de todo mundo. Quando saía, escondia pro pessoal de casa não ver. Toda noite fazia isso. Depois de três ou quatro meses, comecei a dar meus primeiros passos na fotografia digital. Fui aumentando meus conhecimentos e nunca deixei de ler sobre fotografia.
:: Fotografia ::
A fotografia é extensão dos olhos da gente. Até hoje arrepio quando faço foto bonita, fico doidão com ela. O negócio, hoje, vendo a foto sem ter que revelar, ficou mais bacana ainda. Chego num lugar e tiro 300 fotos, porque de um a dez minutos tem grande variação de luz. A luz que mais gosto é a do amanhecer e a do anoitecer, as mais bonitas para fotografia. São luzes rasantes. Depois dessas, a mais bonita é a de 45 graus.
Nasci pra ficar atrás da câmera. Aprendi que, dependendo do ângulo que você faz a foto, ela fica diferente. Mas os melhores ângulos são conseguidos onde ninguém anda, aí a fotografia fica diferente. Isso tende a dar mais riqueza, as pessoas admiram de forma melhor.
:: Mariana e Ouro Preto ::
Trabalhei nas duas cidades, sempre. Considero “Mariana do meu coração” e “Minha Ouro Preto querida”. Falo que nasci no meio certo, na divisa, com um pé em Mariana e o outro em Ouro Preto, olhando pro Pico do Itacolomi, que é das minhas duas cidades queridas.
Admiro os pássaros que não têm fronteiras. Queria que as pessoas fossem assim também, porque o mundo é de todo mundo.
:: Grandes fotógrafos da região ::
Convivi com muita gente boa. Fotógrafo sempre tem uma rixa um com outro, mas eu não tenho, nunca tive. Fui e sou amigo de muita gente. Milton Tropia, Rômulo Caravelli, Gustavo, do Photo Gustavo, que tinha uma loja na rua Paraná, em Ouro Preto. Damião Amaro Lopes, que hoje está mais envolvido com música. Miltinho, Sérgio e Eduardo Tropia, Heber Bezerra, José Eduardo Monte. E o Luiz Fontana. Recuperei todo o acervo dele. Deu muito trabalho. Lavei tudo com água morna, depois punha as chapas no papel manteiga, “pra” aumentar a durabilidade. Limpamos tudo e entregamos para universidade, sem custo, tudo na camaradagem.