Em 2016, quando aprofundava os meus conhecimentos na área do Turismo, para entender melhor a realidade da atividade em Ouro Preto e o seu (dis) funcionamento, participei de um congresso realizado (se não me engano) pela Secretaria de Estado de Turismo de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Nele, uma informação foi muito falada, e frisada, pelos especialistas da área, e me marcou muito também: a importância do transporte, e, claro, da sua democratização, para o pleno desenvolvimento da atividade turística no estado.
Na época, me deu um certo alívio, pois pensei: “nossa, enfim, começarão a investir em algo tão importante para o cidadão mineiro, que é o seu direito de ir e vir com segurança pelas estradas”. No entanto, não foi o que aconteceu no caso de Ouro Preto, pelo menos se tratando da principal via de acesso à cidade, o trecho que liga Belo Horizonte ao município.
Sabemos que a concessão de exploração deste trecho cabe apenas à UMA empresa de ônibus. E a prestação de serviço desta empresa sempre foi controversa. Porém, nos últimos tempos, seus usuários têm vivenciado ainda mais precarização do serviço prestado por ela.
Alguns exemplos desta precarização nos últimos tempos são: as viagens não contam mais com trocador, quando o passageiro não embarca na rodoviária, o pagamento é realizado diretamente ao motorista, ou seja, o motorista, que foi contratado para dirigir e ficar atento à estrada, agora, executa duas funções; os ônibus estão visivelmente desgastados, e isso gera problemas durante a viagem, fato que pude presenciar na semana passada, em que o motor do ônibus em que eu estava começou a sair fumaça logo que saiu de Belo Horizonte, naquele momento, o meu primeiro questionamento (e o de muitos que estavam comigo) foi, "será que este veículo passou por revisão antes de carregar passageiros para o seu destino?" Lembrando que os passageiros eram seres humanos, sim, podem acreditar, eram; os passageiros que esperam pelo transporte em pontos na estrada têm realizado o trajeto em pé quando não há assento, na maior vulnerabilidade, e, obviamente, sem o cinto de segurança, também presenciei este fato no mesmo dia, e vários usuários que estavam no veículo disseram que isso tem sido uma constância. Antes de mais nada, só para esclarecer, há registro em vídeo desta situação, além das testemunhas. E houve também a série de assaltos que ocorreu em 2016 na linha Belo Horizonte/Ouro Preto, e, na época, virou manchete dos principais jornais do estado.
A precarização do serviço está tão “declarada” pela própria empresa que em seu site costumava constar que a previsão de duração da viagem Ouro Preto/ Belo Horizonte (e vice-versa) era de 2h, hoje, a empresa informa que a previsão é de 2h30.
Vamos refletir, em pleno século XXI, ano 2020, a prestação de serviços essenciais, como o transporte, não tinha que estar mais eficiente, rápida e segura? Realmente, quando falam que o Brasil está voltando para a Idade Média está aí um bom exemplo dessa volta. Em um contexto atual de tecnologias avançadas, em todas as áreas, a única empresa que faz o trecho Ouro Preto/Belo Horizonte/Ouro Preto, ou seja, que detém o monopólio dele, está ficando mais lenta. Sim, em pleno 2020, há empresas de ônibus ficando mais lentas... Seria cômico se não fosse trágico.
A tragicidade se dá, principalmente, pela empresa transportar seres humanos (fico até me perguntando se a gestão dela não é realizada por robôs, caso seja, alguém avisa para os seus algoritmos que vidas humanas importam, por favor?). Mas há outro ponto importante a ser lembrado, a precarização do serviço desta empresa impacta diretamente, ou melhor, prejudica diretamente, a atividade turística do município de Ouro Preto.
Bom, se as empresas e o poder público não se importam com as vidas humanas, com a vida do cidadão trabalhador que depende do transporte coletivo, ou daquele cidadão sensato que opta pelo transporte coletivo, pois é um cidadão consciente e preparado para o futuro, talvez, um fio (zinho) de consciência consiga entrar nas mentes dos gestores e empresários quando estes entenderem que a progressiva precarização do transporte deste trecho vai impactar diretamente na economia do município, prejudicando, além de outras atividades, a atividade turística local, pois pode resultar em uma queda no número de visitantes (se é que já não caiu), afinal, se o visitante não tiver o mínimo de segurança para chegar ao seu destino, no caso, na histórica Ouro Preto, ele vai optar por outro destino histórico, pois opções não faltam.
Fico aqui pensando com os meus botões que falta sensibilidade (para não dizer muita inteligência mesmo) até para ganhar dinheiro e incrementar a economia da cidade por parte dos diversos gestores do município, pois, parece, que eles não estão atentos à uma questão tão essencial (vital mesmo) para o pleno funcionamento do turismo em Ouro Preto, que é o transporte, a sua qualidade e a importância da sua democratização. Que coisa, não? Para não dizer, que falta de visão, não é mesmo?
Será que isso ocorre em razão dos diversos gestores, administradores e empresários do setor, se locomoverem apenas em seus carros? Porque assim fica difícil mesmo ter sensibilidade para entender e conhecer as demandas de um turista que não vem à Ouro Preto em veículo próprio, e que, provavelmente, este perfil de turista constitui a grande maioria.
Aliás, devido à questões internas e estruturais da cidade, os diversos gestores e empresários do setor deviam fazer uma campanha para o turista vir à Ouro Preto sem carro e de transporte coletivo, pois (sabemos bem) a cidade não tem estrutura para receber fluxo grande de veículos, e quando isso acontece, o caos se instaura por aqui.
Mas o fato é que com o andar da carruagem (literalmente falando, rs), já que os ônibus da região estão ficando mais lentos em pleno 2020, o único título que Ouro Preto vai ganhar nos próximos anos é o de destino turístico de maior difícil acesso do Brasil. Para não falar sobre o transporte dos distritos, que possuem atrativos incríveis a serem descobertos pelos visitantes (e pelos próprios moradores), mas aí é um assunto complexo demais que vou deixar para uma próxima coluna. O certo é que tem faltado "sensibilidade" até para ganhar dinheiro em Ouro Preto.