Conheci Annamélia em 2017, quando fui curadora e coordenadora da exposição que homenageou os 50 anos do Festival de Inverno de Ouro Preto, uma realização da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Fiquei encantada com a artista desde o nosso primeiro encontro, no qual ela me contou muitas histórias do início do festival e do início da Escola de Arte Rodrigo Melo Franco de Andrade, que ela fundou em 1969 junto de seu companheiro Nello Nuno. Escola que acolheu o primeiro curso de formação de conservadores e restauradores do Brasil, uma iniciativa do restaurador Jair Afonso Inácio, e que pertence à Fundação de Arte de Ouro Preto (FAOP).
Desde este primeiro encontro, pensei, “Annamélia é a história viva do período de efervescência artística e cultural de Ouro Preto”, como ficou conhecido o período entre o final da década de 1960 até meados da década de 1990. Sendo assim, posso afirmar que Annamélia é a história viva do período de efervescência artística e cultural de Minas Gerais, afinal, Ouro Preto era o centro desta ebulição no estado, e não há dúvida disso.
Por tudo isso, e muito mais, quando a conheci, a minha vontade era passar todas as tardes em seu ateliê ouvindo as histórias da nossa história, contadas com a intensidade e a vivacidade de quem as viveu e as construiu. Annamélia não viu a história passar, não foi uma mera expectadora, ela foi uma de suas construtoras. E construção também é a essência da arte de Annamélia.
Neste mês de março, encerrou-se a exposição em homenagem aos seus 60 anos de carreira, e, nos 48 minutos do segundo tempo, consegui ir visitá-la. Logo de início, o choque! Me surpreendi nas primeiras obras, pois fui transportada, imediatamente, para os anos de 1960 e 1970. Os quadros de Annamélia são registros belíssimos, e importantíssimos, da arte deste período. Belíssimos não apenas pela beleza, mas, principalmente, pela originalidade, daí o choque, e daí a necessidade de querer ficar na exposição por muitas horas, totalmente intrigada e absorvida pelas telas da artista. Absorvida em sua originalidade, em sua didática, em seu preciosismo, em sua delicadeza. Que feminino! Poucas vezes vi expresso um feminino tão belo e delicado de se observar na arte mineira.
E as paisagens de Ouro Preto de Annamélia? A minha vontade era ter todas elas na sala da minha casa, só para nunca me esquecer que Ouro Preto é mais que o Barroco! Que Ouro Preto é uma ideia! Uma ideia mística, lúdica, literária, uma ideia que necessita sensibilidade para ser assimilada, necessita a sensibilidade de Annamélia. Quanta didática para expressar Ouro Preto! Aqui incluo a poesia (e muita) no conceito de didática, já que, de fato, seu significado é a arte de ensinar. Didática característica de uma grande professora de arte, didática necessária para fundar a primeira escolinha de arte de Ouro Preto, e, não por menos, foi ela quem fundou.
Infelizmente, não consegui ficar as horas que gostaria na exposição ‘Annamélia 60 anos de arte’, mas no outro dia, que já era o último dia, eu voltei, e consegui ficar mais alguns minutinhos, e teria voltado muitas e muitas vezes se não tivesse se encerrado, pois esse é o poder da arte, esse é o poder da boa arte, o poder de inquietar, o poder de mover, a sua infinitude...